Entrevista a Rute Ventura – HipoGes Women’s Month

Entrevista a Rute Ventura – HipoGes Women’s Month

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Quem é Rute Ventura? Conte-nos um pouco sobre si e a sua carreira

Tenho 49 anos. Trabalho há pouco mais de 30, o que já é uma vida. Sou casada e tenho uma linda filha.

Licenciei-me em 1994 em Gestão pela Universidade Técnica de Lisboa (Instituto Superior de Economia e Gestão), marcando indelevelmente o meu cariz eminentemente financeiro.

Ensinei matemática, fui Relações Públicas e secretária, enquanto estudava. Quando terminei a faculdade ingressei na Banca onde permaneci 25 anos, tendo passado por diversas funções desde a rede comercial, Canais à distância, Marketing estratégico, Planeamento Estratégico, controlo e Contabilidade e recuperação de crédito. Desde 2015 ingressei no mundo dos NPL onde tive a oportunidade de desempenhar o papel de Head of Non-Core Assets, desenvolvendo várias iniciativas na desalavancagem de ativos não produtivos, em especial NPL e REO. Desde maio de 2020 desempenho funções de Diretora de Corporate e Bank Servicing na HipoGes Iberia.

Na sua opinião, quais são os principais desafios que as mulheres enfrentam no dia-a-dia e no mundo do trabalho?

Francamente penso que o equilíbrio entre a vida profissional e pessoal ainda é o principal desafio. Embora seja evidente que as famílias têm hoje uma melhor dinâmica, ainda observo muitas mulheres a serem responsáveis/responsabilizadas pelos trabalhos domésticos, por cuidar dos filhos, etc… para além da atividade profissional. Depois considero que as próprias mulheres têm sentimentos de culpa por quererem buscar a realização profissional, sendo suas próprias inimigas. Muitas mulheres sentem-se más mães, más donas de casa, etc… porque ambicionam uma carreira profissional. É algo que ainda está no subconsciente de muitas mulheres, provavelmente passado pelas suas próprias mães. Adicionalmente penso ainda ser o efeito de uma sociedade ainda muito estigmatizada, que, na verdade, ainda penaliza a mulher por ter que levar os filhos ao médico, ou ficar com eles em casa doentes, ou sair mais cedo para ir buscar os filhos à escola. Mas hoje muito menos, felizmente.

Por fim, lamentavelmente ainda é verdade que uma mulher tem de trabalhar muito mais que um homem para ser reconhecida profissionalmente, quer em termos de salário, quer em termos de oportunidades.

Qual é o feito de que mais se orgulha?

Sem dúvida que é ser mãe.

Em termos profissionais a minha maior conquista na vida é ter chegado onde estou hoje. Venho de uma origem muito humilde, de uma família muito numerosa, estudei e trabalhei desde muito jovem, e, com muito trabalho, empenho e força de vontade, sem perder os meus valores e ideais, cheguei a um patamar de uma carreira inimaginável no início da minha vida profissional.

Especificamente na minha área: orgulho-me de ter integrado a equipa responsável pela primeira securitização pública de NPL com rating em Portugal em 2017 (EVORA FINANCE). Foi um marco.

Que medidas acredita serem as necessárias para se atingir uma verdadeira igualdade?

Embora considere que é evidente o progresso nesta área, e por muito que considere o tema polémico, infelizmente nos cargos de topo é mesmo necessária a existência de quotas. O sistema de quotas apenas é necessário pois um sistema baseado no mérito e nas competências simplesmente não está a funcionar. Especialmente no mundo financeiro, sejamos francos, ainda é um mundo muito masculino. Senão observe-se quantas mulheres se vêm nos Conselhos de Administração, Comissões Executivas em cargos como CEO ou CFO?

Em geral, tenho esperança nas gerações futuras onde a inclusão é um tema muito mais natural. Mas ainda nos resta pelo menos uma década. Acredito que os jovens de hoje na casa dos vinte anos têm uma visão mais inclusiva, mas precisam estar nas empresas em cargos decisivos para uma verdadeira mudança na sociedade. A minha geração apenas desbravou o caminho.

Qual é o fator diferencial com o qual as mulheres podem contribuir na empresa?

Sem dúvida que considero que as mulheres não são iguais aos homens, e ainda bem. Assim sendo, o pior caminho que por vezes observo é a masculinização do papel da mulher nas empresas. Não pretendendo generalizar, diria que as mulheres são tipicamente mais emocionais, mais organizadas e com uma gestão de tempo mais equilibrada. Isto são forças quando se canalizam para uma gestão de pessoas equilibrada, para a melhoria na qualidade e eficiência dos processos e para o foco nos resultados. Na verdade, considero que cada um tem um conjunto de talentos que devem ser geridos de forma a maximizar o resultado final. Esse resultado final não é apenas financeiro, mas também cultural, de clima social, etc… É a partir da diversidade que se fazem empresas fortes. Mas baseado no mérito e nas competências. Nunca no género.

O que acha de se comemorar o Dia Internacional da Mulher?

Para ser franca durante anos achei que era errado. Pensava que só existiam dias para minorias e que o dia da Mulher era na verdade vexatório para a própria Mulher. Mas, mais tarde quando percebi a origem do dia, o que esteve em causa, o sacrifício daquelas mulheres e como isso acabou por marcar um momento de viragem histórica, mudei de opinião. É um dia de homenagem àquelas mulheres, às nossas mães e avós que nunca foram valorizadas porque ser doméstica era ser um ser de segunda, às mulheres que lutaram com todas as forças para serem ouvidas e para deixarem a sua marca indelével na sociedade.  Olho cada ano e dedico o dia a todas as super-mulheres que se desfazem entre todos os papéis de mãe, esposa, filha, amiga, e ainda grandes profissionais e grandes pessoas.

Hoje confesso que olho para o Dia da Mulher e homenageio o percurso realizado no século 20 para a mulher ser considerada um ser igual, com os mesmos direitos e deveres. Estamos na 3ª década do século 21 e ainda não estamos lá… Mas estamos tão mais perto.

Olho nesse dia com tristeza para todas as mulheres que são maltratadas e desrespeitadas por esse mundo e dou graças a Deus por ter nascido em Portugal, onde esta evolução é indelével.

Que mensagem gostaria de passar às jovens?

Pode parecer um cliché, mas afirmo que com esforço tudo se consegue. Que não abandonem a sua essência, a sua feminilidade, nem o seu código de valores e conduta, porque isso é a nossa coluna vertebral. Nunca desistir. A cada derrota, levantar a cabeça e seguir em frente com dignidade. O sucesso vai acontecer! Aconteceu-me a mim e foi exatamente assim!